sábado, 29 de dezembro de 2012

A LÓGICA DA REGULAMENTAÇÃO DA ACUPUNTURA E DA MEDICINA NO CONGRESSO NACIONAL

Prof. Sohaku Bastos

Como funciona o nosso Congresso Nacional, poder da Republica que os brasileiros deveriam ter orgulho, mas que tem caminhado por veredas duvidosas ao requerer ''situações especiais'' de tramitação de Projetos de Lei em regime de “urgência”?
O caso dos royalties do petróleo é um desses projetos que está atropelando o rito natural de tramitação, visando favorecer a determinados segmentos políticos. O outro caso emblemático no Congresso Nacional, particularmente no Senado Federal, é o da regulamentação da Medicina no Brasil, projeto de lei que teve origem na Câmara Federal, e que tramitou dentro de uma coerência legislativa aceitável, mas, que agora, no apagar das luzes do ano de 2012, num açodamento jamais visto, alguns senadores, motivados não se sabe o porquê, tentam aprová-lo sem a necessária reflexão sobre os efeitos sociais de tal projeto.

Todo projeto de lei que ao final de cada ano tem sua tramitação acelerada, certamente, tem algo errado e obscuro. Repentinamente, melhor dizendo, desapercebidamente, no apagar das luzes de todos os anos, aparecem essas "urgências" para a aprovação de Projetos de Lei dos mais polêmicos aos mais extravagantes, na maioria das vezes para beneficiar algum grupo ou alguns interesses, longe da opinião pública e de muitos políticos contrários a esse tipo de manipulação do poder legislativo.

Vejam agora o que está acontecendo no Senado Federal com o Projeto de Lei que pretende regulamentar a Medicina no Brasil, conhecido como Projeto do Ato Médico. Durante todo o ano o referido Projeto tramitou dentro de uma coerência administrativa. Porém, no apagar das luzes do ano de 2012, aparecem as manipulações para aprovarem projetos que necessitam de maior discussão no seio da sociedade, pois o POVO, aquele que paga os impostos e elege os membros do legislativo, está "out", ou seja, está alheio às discussões sobre o assunto. O Distrito Federal não foi transferido para a Região Centro-Oeste do país para se transformar em um Bunker, uma fortaleza de poder para beneficiar a alguns poucos e prejudicar a muitos. Longe da opinião pública as coisas acontecem ao sabor dos lobbies e interesses inconfessáveis. Por que tanta pressa e tanto interesse em aprovar um Projeto de Lei que todos sabem ser inconstitucional? Por que a afobação de tramitá-lo de qualquer maneira para deixar a discussão final para a sessão plenária dessa casa de Leis, onde os acordos e conchavos politiqueiros ocorrem nas barbas da imprensa e nada é feito, acarretando futuras demandas judiciais no Supremo Tribunal Federal.

O Projeto de Lei do Ato Médico é tão estapafúrdio que o próprio Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde se posiciona contrário. Além disso, todos os segmentos da área da saúde são contra, incluindo os estudantes de medicina. A maioria da classe médica é igualmente contrária ao texto do referido Projeto. Ora, quem então é a favor dessa excrescência e a quem ela favorece? Vamos dissecar este monstrengo?

Inicialmente, faz-se mister indagar o quanto custa ao erário publico centralizar o poder da saúde e quais os beneficiários dessa estratégia. É do conhecimento de todos que o sistema de saúde do Brasil tem dono, e esse poder é fracionado em segmentos como foram criadas por aqui, no século XVI, as capitanias hereditárias. Na atualidade, os donos do poder não são eleitos pelo povo, pois eles estão representados por seus "testas de ferro" para defenderem seus próprios interesses. São eleitos pelo voto direto, porém muitas vezes manipulados a revelia do pobre cidadão. Todos os que defendem os corporativismos, as jogadas políticas, facilitando a falcatrua, agem como verdadeiros estelionatários eleitorais. Irremediavelmente, não há solução em curto prazo para que tenhamos uma representação legislativa isenta e imparcial. Com o amadurecimento da democracia no país será possível atingir esse ideal. Mas, enquanto isso, somos forçados a fiscalizar os atos legislativos para evitar que forças ocultas e lobbies agressivos consigam atingir seus objetivos, na maioria das vezes em prejuízo para a sociedade.

As tramitações dos Projetos de regulamentação da Medicina e da Acupuntura andam em paralelo no Senado Federal. Todavia, o projeto da Acupuntura caminha vagarosamente, sem “urgência” com muitos pedidos de vistas pelos parlamentares quando não, sobrestado. Já o projeto da Medicina tem outro tipo de tratamento e agilidade dentro do Senado, uma vez que muitos senadores e deputados são médicos e são pressionados pelo lobby das entidades da classe médica, sobretudo do Conselho Federal de Medicina. À propósito, quem é que paga esses lobistas? São recursos oriundos da anuidade dos profissionais médicos, ou são recursos de outra origem? Se for assim, que fique clara para os médicos a procedência desses recursos. Quanto aos profissionais de acupuntura, estes sim não têm recursos para bancar lobbies em Brasília, tampouco contam com o apoio da maioria das instituições da área no tocante à captação de recursos para constituir lobbies.

Onde há lobby há corporativismo, onde há corporativismo há manipulação de interesses para se conseguir objetivos quase sempre em detrimento dos interesses sociais. Esses interesses se resumem em duas palavras: poder e lucro. O lucro pode ser financeiro ou político. Porém, o Estado é o responsável, pois não tem exercido o seu legítimo papel de fiscalizador dos movimentos corporativistas, que sem controle tornam-se profundamente deletérios para a sociedade e para a democracia. O Brasil é o país do corporativismo! Por aqui as coisas funcionam muito bem à base dos lobbies e dos interesses corporativistas à luz da opinião pública e dos governos, e fica por isso mesmo. Os próprios governos aceitam esses lobbies, e se fortalecem com eles. Os poderes da República Federativa do Brasil são cortejados pelos segmentos corporativistas em defesa de seus domínios e em defesa de seus membros, mesmo que eles caminhem por vias obscuras. Quando isso vai acabar? Acredito que jamais, enquanto não houver uma transformação radical no sistema político do país, o que significaria lavar a cara e purificar os corações de uma parte significativa dessa gente que é, patologicamente, obcecada pelo poder e insaciável pelo dinheiro. A antiética da política brasileira, na qual se confunde o público com o privado, tem favorecido o conluio de políticos com empresários corruptos. Até mesmo autarquias, entidades sindicais, e outras instituições de interesse público são, eventualmente, flagradas em pleno delito dessa natureza. No caso das corporações profissionais isso também acontece com a mobilização de lobbies para a defesa de seus próprios interesses, alguns dos quais em franco conflito com a ética, com a verdade e com a justiça.

No caso da Medicina, a verdade é que ela tem que ser regulamentada no país, sobretudo para defender a população contra atos médicos inadequados, evitando assim o erro profissional, seja ele por negligência, por imprudência e, sobretudo, por imperícia. O que não é mais aceitável é que nessas circunstâncias projetos de lei venham tentar robustecer as competências do profissional médico em áreas do conhecimento da saúde que ele jamais estudou e que é de competência de outros profissionais. Esse é o xis da questão: competências!

É inimaginável aceitar a tese de que apenas o profissional médico tenha competência para diagnosticar e tratar pacientes com total exclusividade, atropelando as competências dos demais profissionais da área da saúde em pleno século XXI. Absurdos como este só podem ter abrigo em países que estejam submetidos a regimes autoritários ou cuja opinião pública esteja completamente alienada das questões sociais. Infelizmente, nossos políticos sabem disso, mas fingem que estão defendendo o cidadão, incorporando uma posição maniqueísta que se refletirá em um futuro preocupante.

No chamado “jogo democrático tupiniquim” do Congresso Nacional tudo pode acontecer em seus bastidores para que os mais fortes, ou os que tenham mais poder econômico, tirem vantagens de todo tipo. A máquina médico-farmacêutica , em particular, atropela todos os outros interesses, inclusive o social, para fazer valer seus objetivos: o lucro financeiro e o poder político. Essa máquina de poder tentará submeter toda sociedade a um sistema de saúde ineficiente e caro.

As Práticas Integrativas e Complementares em Saúde, instituídas pelo Ministério da Saúde no ano de 2006, foram alvo de críticas e perseguições por parte dos Conselhos de Medicina e de órgãos relacionados a estes, com o objetivo de esvaziar um programa social de excelente qualidade. O fato é que este programa não dava lucro ao segmento médico-farmacêutico do país. A reação do corporativismo foi tanta que o Conselho de Medicina do Rio de Janeiro publicou no Jornal O Globo um anúncio caríssimo com o seguinte título: “Ministério da Saúde faz mal a Saúde”. Absurdos como este, com divulgação nas principais mídias do país, têm induzido a população ao erro de avaliação. A grande massa da população brasileira está completamente alienada dessas questões e é exatamente por isso que essas entidades que possuem certo “crédito social” se aventuram em lançar suas “opiniões” em público, passando-se como vítimas do sistema ou em defesa da sociedade...

Quando a sociedade avoca o Poder Judiciário, no caso o Supremo Tribunal Federal, para se socorrer de desmandos inconstitucionais dos outros poderes da Republica é porque a coisa está feia, a coisa vai muito mal...

 O Governo Brasileiro terá que controlar essas ambições desmedidas dos corporativismos e sancionar leis que realmente sejam em benefício da sociedade, fazendo prevalecer a verdade, a justiça e o bem social. Regulamentar a Acupuntura, sim, porém sem exclusividade. Regulamentar a Medicina, sim, mas sem medicocracia.

2 comentários:

  1. Parabéns pela postagem,diz tudo,você "destrinchou" essa falta de vergonha nacara dos políticos e médicos;
    Além de tudo a acupuntura cresceu mais de 500% e os poucos médicos acupunturistas crerem prejudicar a população que ficará sem atendimento

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  2. É isso Rafael, as pessoas precisam conhecer a verdadeira politicagem que ocorre quando há interesse de classe sem pensar nas consequências que isso possa trazer a para a sociedade em geral, a população que paga para ser representada e no final de tudo ainda sofre consequências por serem mal representadas.

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